quarta-feira, 31 de agosto de 2016

CAÇADORES DE DEMÔNIOS

     Durante a idade média, tudo de ruim era atribuído à ação de demônios. A peste bubônica, que devastou grande parte da população europeia, era atribuída à atuação demoníaca. Colheitas ruins, distúrbios mentais, e muitas outras coisas eram consideradas de origem satânica por meio da invocação de seus servos humanos. Muitos dedicaram-se ao ofício de caçadores de bruxas, especializando-se em “reconhecer as características” da atividade demoníaca. Muitas mulheres foram torturadas e mortas acusadas de bruxaria. No século XIX, inspirado nos caçadores de bruxas, surgiu na literatura o personagem Van Helsing, o caçador de vampiros e outros monstros demoníacos. No Brasil, boa parte de nosso povo tão afeito à superstição, cultiva crenças semelhantes às medievais, das quais Satanás sabe tirar proveito para aprisiona-los nas trevas.
        Embora saibamos pela Palavra de Deus que existem fenômenos sobrenaturais, hoje conhecemos as causas de muitos fenômenos que antes eram tidos como malignos. A própria Bíblia nos apresenta o discernimento necessário para sabermos distingui-los. Entretanto, ainda existem crentes inclinados a darem crédito a toda estória estapafúrdia que surge. E essas histórias surgem daqueles que se dedicam a produzirem todo tipo de crença irracional e sem respaldo bíblico, atribuindo tudo aos demônios. São os modernos “caçadores de demônios”. Caçadores de bruxas existiam na idade média devido ao atraso da ciência e ao desconhecimento da Palavra de Deus. Causa-me espanto como hoje ainda multiplicam-se tantos crentes “caçadores de demônios”.
       No início do meu pastorado, havia uma onda nas igrejas de descobrir mensagens ocultas nos discos LPs. Era necessário girá-los em sentido inverso. Muitos “caçadores” gastavam mais tempo girando os discos ao contrário do que lendo a Bíblia e orando. E por vezes até repetiam as horríveis blasfêmias que acreditavam terem descoberto.
        Depois o novo grande inimigo eleito pelos evangélicos era o movimento “Nova Era”. Muitos palestrantes percorriam as igrejas alertando que havia muitos símbolos do movimento com um significado maligno oculto, e quem os usasse ficaria sob influência demoníaca. Os adolescentes de nossa igreja fizeram bonitas camisas com um desenho do sol nascendo e os seguintes dizeres: “Em Cristo há um novo dia”. Uma “caçadora” quase enfartou e gritou: “Não usem essas camisas. O Sol é um dos símbolos da Nova Era”. Exortei aquela irmã perguntando-lhe quem criou o Sol, e se o profeta Malaquias errou ao anunciar a vinda de Jesus como o nascimento do “Sol da Justiça”. Esquecendo-se da outra realidade verdadeiramente satânica que permeia a religiosidade brasileira, que é a idolatria e a feitiçaria, os evangélicos fizeram mais propaganda do movimento “Nova Era” do que ele próprio. 
     Assisti a um vídeo de um desses “caçadores” em que nos alertava para não fornecermos às crianças fitas de vídeo de um determinado desenho animado, pois os produtores o teriam consagrado ao Diabo, e cada fita abrigaria um demônio que possuiria cada criança que o assistisse. Para provar o que dizia, mencionou um trecho da animação que, se fosse assistido em baixa velocidade revelaria uma nuvem de poeira em forma da palavra sexo. Tentei várias vezes e não consegui visualizar a tal nuvenzinha subliminar. Contudo, na animação havia uma clara propaganda da falsa crença de que é possível falar com os mortos. Isto sim é muito perigoso para as crianças, pois as induz a crenças totalmente contrárias à Palavra de Deus. Este fato o “caçador” não mencionou.
          Atualmente os  tais “caçadores” elegeram a internet como meio eficiente de propagar seu pânico cego e supersticioso. Proliferam nas redes sociais as afirmações mais esdrúxulas de superstição “gospel”. E como é crédula grande parte do povo evangélico! Basta alguém afirmar algo bem sensacionalista que muitos acreditam sem avaliar e passam adiante. Tempos atrás circulou uma mensagem afirmando que o “ratimbum” tão comum nas festinhas de aniversário infantis na hora de soprar as velinhas deve ser totalmente banido. O motivo, afirmou o caçador,  é que seria uma invocação demoníaca em um idioma antigo. A mim sempre pareceu o som onomatopéico da percussão de uma bandinha. Mesmo assim fui pesquisar e não encontrei nenhuma confirmação consistente e coerente da afirmação dos “caçadores”.
  Recentemente assisti um vídeo que circula nas redes sociais em que uma suposta mãe afirma que seu filho pequeno queria ser menina porque estava possesso de uma entidade da umbanda que aparecia para ele e lhe sugeria que ele poderia ser uma menina. Como todo este tipo de material circulando por aí, o autor do vídeo não se identifica nem coloca um e-mail para quem deseja mais esclarecimentos. A falta de uma fonte segura já é suficiente para tirar a credibilidade deste tipo de material. Mas vamos analisa-lo: É, até certo ponto, comum crianças pequenas ficarem em dúvida quanto ao próprio sexo. Há algumas causas, com as quais os pais devem lidar com sabedoria para que as crianças desenvolvam sua sexualidade de maneira saudável, segundo os padrões bíblicos. A Associação Americana de Pediatras afirma que há dados estatísticos demonstrando que, destas crianças, 98 % dos meninos, e 88 % das meninas ajustam-se ao seu próprio sexo biológico até o final da puberdade (http://www.acpeds.org/the-college-speaks/position-statements/gender-ideology-harms-children). Também é muito comum crianças pequenas terem “amigos imaginários”. Será que essa suposta mãe não concluiu que poderia ser uma determinada entidade e sugeriu a descrição para seu filho, que teria concordado com ela? A suposta mãe afirma ter orado durante quarenta minutos impondo as mãos sobre a cabeça da criança, e ela chorava muito até que ela lhe pediu perdão. Certamente a mãe já censurara seu desejo de ser menina. Qual criança não choraria e pediria perdão numa situação desta? E se tudo isto realmente foi verdade, torna-se uma regra?
  Creio que falta discernimento e sobra superstição aos “caçadores de demônios”. E a superstição, esta sim é arma do Inimigo,  pois ele a utiliza para afastar as pessoas dos verdadeiros ensinos de Deus. Tais “caçadores”, sem perceber, estão contribuindo para fomentar ainda mais a mentalidade supersticiosa de boa parte de nossa população.
  Satanás procura opor-se a Deus. A Bíblia nos alerta sobre quais são os verdadeiros objetivos do Inimigo e como ele age para alcança-los. Apresento aqui os principais: Levar o homem a duvidar da Palavra de Deus para que o desobedeça e não tenha comunhão com Deus, sofrendo condenação eterna (Gênesis 3:1-24, Lucas 8:12, João 10:10). Quanto aos crentes, ele usa artimanhas e perseguições para que enfraqueçam na fé e esfriem no amor e não sirvam aos propósitos de Deus (Efésios 6:11, I Pedro 5:8-9). Para atingir seus objetivos, ele age dissimuladamente e usa o engano e a falsidade (João 8:44, I Tessalonicenses 2:7). Ele procura influenciar os valores e princípios da sabedoria humana (Tiago 3:14-15). Assim ele pode também influenciar fortemente a cultura e os valores que regem as estruturas e instituições sociais (I João 5:19).
  Porém, a vitória de Cristo e seus salvos já está assegurada por Deus, o Senhor da história (Apocalipse 12:7-12). Se queremos realmente cooperar com os propósitos de Deus e ficarmos firmes contra as ciladas do Inimigo, ao invés de nos tornarmos “caçadores de demônios”, devemos orar e vigiar para resistirmos às tentações, nos vestirmos com a armadura de Deus, e proclamarmos e vivermos a Palavra de Deus (Mateus 26:41, Efésios 6:10-20). É ela é a arma que derrota o inimigo, pois leva as pessoas a renderem-se a Cristo e permanecerem firmes sob o seu domínio (Efésios 6:17). Glória ao nosso Deus eternamente.