domingo, 5 de dezembro de 2010

COMPLEXO DO ALEMÃO: SÓ UMA PONTA DO NOSSO ICEBERG

Há uma sensação de alívio, otimismo e alegria no Rio de Janeiro após a invasão e ocupação policial do Complexo do Alemão, maior reduto do tráfico no Grande Rio. Segundo os responsáveis, é uma ação emblemática do que vai continuar a ser feito, e cada ocupação será imediatamente seguida da implantação de núcleos que promovam segurança e cidadania Ficamos estarrecidos com a enorme quantidade de armas apreendidas e com as toneladas de tóxicos, que continuam sendo encontradas. Como as coisas chegaram a este ponto? Algumas causas principais são logo apontadas por sociólogos, jornalistas, juristas, criminologistas, especialistas em segurança, historiadores, enfim muitos estudiosos, (até filmes arriscam seus palpites), e temos que concordar que são óbvias:
1.    Pouca ação do estado no combate ao crime organizado.
Segundo artigo da Revista Época n° 654, p.106, nos anos 80 o então governador Leonel Brizola “pregava que a polícia não devia entrar nas favelas para evitar a morte dos inocentes”. Enquanto isto, o tráfico encastelou-se nas favelas, organizou-se e armou-se melhor. Este era um problema ingrato para os governantes resolverem, pois havia o sério risco de repercussões eleitoreiras negativas. Faltava vontade política para levar a cabo esta tarefa.
2.     Crescimento caótico das favelas no Rio de Janeiro
Também durante os anos 80 o crescimento das favelas foi grande e caótico no Rio de Janeiro. Tais comunidades ocorrem geralmente em morros, formando um intrincado labirinto de ruelas apertadas. A ausência do estado nestes locais deixou os moradores desprovidos de seus direitos de cidadania e reféns dos criminosos. A situação geográfica e utilizar os habitantes como escudos proporcionam excelente vantagem estratégica para os bandidos.
3.     Corrupção no meio das forças de segurança
A grande maioria dos policiais de Rio de Janeiro é de homens e mulheres honestos e dedicados. Por ano, morriam em torno de 40 policiais no combate ao crime. Mas é fato que a corrupção de uma minoria de policiais tem contribuído para a ação impune dos criminosos. Há muitos anos a imprensa divulga casos de corrupção policial.
4.     Sistema de leis com pontos fracos
Há brechas em nossas leis que os advogados dos criminosos sabem explorar para que fiquem em liberdade. Alguns dos criminosos refugiados no Complexo do Alemão estavam presos, receberam indulto, mas não regressaram para cumprir o restante da pena. A ordem para “tocar terror no asfalto” foi transmitida por familiares e pelos advogados dos chefões presos. Um representante da OAB protestou quando soube que o Ministério da Justiça planejava monitorar as conversas dos advogados com os presos durante as visitas, afirmando que fere um direito constitucional.
Entretanto, há uma causa de grande relevância que pouco é mencionada: se há um tráfico de drogas nestas estarrecedoras dimensões, é porque há uma multidão enorme de usuários comprando drogas e alimentando toda esta situação. A primeira apreensão de drogas do Complexo do Alemão que foi destruída era suficiente para fabricar aproximadamente 1.800.000 cigarros de maconha, e 30.000 doses de cocaína. O que leva as pessoas a se drogarem? Médicos falam de dependência química como uma doença semelhante ao alcoolismo, que a pessoa já nasce com ela. Psicólogos falam de vazio existencial, necessidade de aceitação em grupo e busca pelo prazer. Alguns antropólogos tentam ver o uso de drogas como parte dos rituais de determinadas culturas urbanas.
Contudo, é facilmente observável que a explosão do consumo de drogas coincide com a secularização da sociedade e com a destruição da família e dos referenciais morais. A idéia de sintonia com Deus como necessidade básica para felicidade do indivíduo foi desacreditada e até ridicularizada. As gerações atuais têm em comum o acentuado individualismo, a busca pelo prazer como principal motriz da existência e a falta ou abandono dos referenciais morais tradicionais.Como conseqüência, milhões de pessoas vivem a amarga experiência do vazio afetivo, existencial e espiritual, buscando nas experiências de prazer o sentido e a razão de viver. Tais indivíduos, especialmente adolescentes e jovens oriundos de lares com profundos distúrbios, são presas fáceis do uso de drogas. São multidões de vidas aprisionadas e destruídas, e ajudando decisivamente a alimentar a criminalidade. Durante alguns anos trabalhei como voluntário em uma instituição evangélica de recuperação de dependentes químicos. Entre outras coisas, fazia o primeiro contato com as pessoas que queriam ajuda. A maioria delas era originária de lares com sérios problemas, e muitas não tinham nem a noção de temor a Deus.
Fico pensando sobre a nossa responsabilidade como evangélicos históricos, mais especificamente, batistas, nesta tragédia. O que fazíamos enquanto tudo acontecia? Durante os anos 70 começamos a flertar com as teologias neoliberais. Nos anos 80 supervalorizamos a ação social em detrimento da evangelização. Nos anos 90 e 2000 foi a vez dos ventos neo-pentecostais varrerem muitas igrejas e da busca por métodos e estratégias miraculosas de crescimento de igreja. Finalmente, parece que muitas igrejas e líderes voltam a entender que nossa principal responsabilidade (inclusive social) é pregar o verdadeiro Evangelho de Cristo, que salva o ser humano em todas as suas dimensões.
Vejo com grande alegria iniciativas da nossa Junta de Missões Nacionais como a Cristolândia e as comunidades terapêuticas para dependentes químicos. Ela está, muito bem, atacando causas e conseqüências. Mas ainda é pouco. É preciso que todos os batistas, através do seu testemunho cristão e do trabalho de suas igrejas, engajem-se no trabalho da salvação e reconstrução de vidas e famílias de nosso país. Precisamos estar conscientes da nossa identidade de servos de Cristo, da nossa natureza de regenerados em Cristo, e da nossa missão de pregar o Evangelho a toda criatura. Precisamos muita pressa. Não sabemos quanto tempo nos resta.
Pr. Dalton S. Lima