Até alguns anos atrás havia consenso quase
total entre os evangélicos brasileiros de que não deveriam fazer
uso de bebida alcoólica. O ensinamento geral dos textos bíblicos e
o fato do álcool ser tóxico eram motivos suficientes. Entretanto,
hoje existem evangélicos (até pastores) que defendem o consumo da
bebida alcoólica. Para isto procuram respaldo em alguns textos
bíblicos.
Entre os povos antigos, já era conhecido o
caráter prejudicial da bebida alcoólica. Textos antigos relatam, e
são confirmados por descobertas arqueológicas, que os gregos
evitavam fazer uso de bebida alcoólica. Bebiam o vinho diluído em
quatro partes de água para evitar seus efeitos indesejáveis. Só
bebiam vinho alcoólico puro quando queriam embriagar-se .
A mesma prática de diluir o vinho fermentado em água era comum
entre os judeus: “O Talmude (uma obra judaica que trata das
tradições do judaísmo entre 200 a.C. e 200 d.C.) fala, em vários
trechos, da mistura de água com vinho (e.g., Shabbath 77a; Pesahim
1086). Certos rabinos insistiam que, se o vinho fermentado não fosse
misturado com três partes de água, não podia ser abençoado e
contaminaria quem o bebesse. Outros rabinos exigiam dez partes de
água no vinho fermentado para poder ser consumido”
. Certamente, isto era resultado do ensino da Palavra de Deus.
Na Bíblia, a palavra vinho aparece
referindo-se tanto ao suco de uva como ao vinho com teor alcoólico.
O contexto em que a palavra é empregada é que nos esclarece a qual
dos dois se refere. A expressão bebida
forte refere-se sempre à bebida alcoólica. Também há textos
bíblicos que mencionam vinho novo referindo-se ao suco de uva, e
vinho velho referindo-se ao que já passou pelo processo de
fermentação e possui teor alcoólico. O Senhor Jesus comparou sua
mensagem e domínio ao vinho novo, sem álcool, e ao censurar os
fariseus por se apegarem a tradições corrompidas, comparou-os
àqueles que preferem o vinho velho mesmo depois de provarem o vinho
novo (Lucas 5:30-39). Está implícita, embora secundária neste
texto, a reprovação de Jesus ao uso do vinho velho (caso contrário,
não teria usado esta comparação). E trata-se também de um forte
indício de que, à época de Jesus, os judeus preferiam o vinho
novo.
Alguns textos isolados podem causar a impressão
de que o uso da bebida alcoólica é recomendado aos crentes. Mas a
Bíblia, como um todo, condena o uso da bebida. Obviamente, devemos
aceitar o ensino geral da Bíblia. Caso contrário, as conclusões
serão incoerentes com o contexto maior. Sobre isto, o pastor Delcyr
de Souza Lima afirmou: “Nossas decisões para formarmos um modelo
de vida não podem ser tomadas com base em textos obscuros ou de
aplicação em casos de exceção. Nossas decisões devem ser tomadas
baseadas no que é claro e objetivo. Vivemos pelo que entendemos, e
não pelo que não entendemos.”. Examinemos os textos:
1. TEXTOS CLARAMENTE CONTRÁRIOS
Não bebereis vinho nem bebida forte, nem
tu nem teus filhos contigo, quando entrardes na tenda da revelação,
para que não morrais; estatuto perpétuo será isso pelas vossas
gerações, E para fazer diferença entre o santo e o profano e
entre o imundo e o limpo, E para ensinar aos filhos de Israel todos
os estatutos que o SENHOR lhes tem falado por meio de Moisés.
Levítico 10:9-11
Explicação: Trata-se de uma ordem para os sacerdotes, que
deveriam apresentar ao povo o ideal de uma vida de santidade a
serviço de Deus. O uso da bebida forte é apresentado como algo
impuro e profano.
abster-se-á de vinho e de bebida forte;
não beberá, vinagre de vinho, nem vinagre de bebida forte, nem
bebida alguma feita de uvas, nem comerá uvas frescas nem secas.
Números 6:3
Explicação: Esta ordem é dada aos nazireus, isto é, os
primogênitos, que eram consagrados a Deus desde o seu nascimento, ou
pessoas que espontaneamente faziam o voto de se consagrarem a Deus.
Note-se que todo risco de ingestão de álcool deveria ser evitado,
pois com o passar do tempo o vinho novo fermentaria ao envelhecer e
produziria teor alcoólico. O vinagre é resultado da última etapa
da fermentação, quando o álcool é transformado em ácido acético.
Entretanto, naquela época não dispunham de meios para saber quando
todo o álcool já estava ausente.
Note-se também a preocupação radical de que o nazireu não
ingerisse nada que lhe lembrasse o vinho, para que não pensasse em
seu consumo.
Fica realmente evidente que, aquele que era consagrado a Deus deveria
praticar uma recusa radical em relação à bebida alcoólica.
Agora pois, toma cuidado, e não bebas
vinho nem bebida forte, e não comas coisa alguma impura;
Juízes 13:4
porém disse-me: Eis que tu conceberás e
terás um filho. Agora pois, não bebas vinho nem bebida forte, e
não comas coisa impura; porque o menino será nazireu de Deus,
desde o ventre de sua mãe até o dia da sua morte.
Juízes 13:7
de nenhum produto da vinha comerá; não
beberá vinho nem bebida forte, nem comerá coisa impura; tudo
quanto lhe ordenei cumprirá.
Juízes 13:14
Explicação: Esta ordem diz respeito a Sansão, pois o
Espírito do Senhor estaria nele deste o ventre de sua mãe, para que
ele fosse usado poderosamente como libertador de seu povo.
O vinho é escarnecedor, e a bebida forte
alvoroçadora; e todo aquele que neles errar não e sábio.
Provérbios 20:1
Para quem são os ais? para quem os
pesares? para quem as pelejas, para quem as queixas? para quem as
feridas sem causa? e para quem os olhos vermelhos?
Para os que se demoram perto do vinho, para
os que andam buscando bebida misturada.
Não olhes para o vinho quando se mostra
vermelho, quando resplandece no copo e se escoa suavemente.
No seu fim morderá como a cobra, e como o
basilisco picará.
Os teus olhos verão coisas estranhas, e tu
falarás perversidades.
o serás como o que se deita no meio do
mar, e como o que dorme no topo do mastro.
E dirás: Espancaram-me, e não me doeu;
bateram-me, e não o senti; quando virei a despertar? ainda tornarei
a buscá-lo outra vez.
Provérbios 23:29-35
Não é dos reis, ó Lemuel, não é dos
reis beber vinho, nem dos príncipes desejar bebida forte;
Provérbios 31:4
Explicação:
O Livro de provérbios é muito claro em suas advertências quanto
aos perigos do uso da bebida alcoólica. Sua ordem é para nem se
expor à tentação de consumir (“não olhes para o vinho”), numa
atitude de total rejeição, pois seu uso se contrapõe totalmente à
sabedoria. Assim, a tentativa de fazer uso moderado da bebida
alcoólica, não é aprovada e opõe-se à sabedoria, pois o risco
potencial da embriaguez e suas consequências sempre estão
presentes. O autor de Eclesiastes colocou a sua tentativa de fazer
uso moderado do álcool sem afastar-se da sabedoria na lista de
coisas vazias e sem sentido (Eclesiastes 2:3-11).
• Mas também estes cambaleiam por causa do vinho, e com a
bebida forte se desencaminham; até o sacerdote e o profeta
cambaleiam por causa da bebida forte, estão tontos do vinho,
desencaminham-se por causa da bebida forte; erram na visão, e
tropeçam no juizo. Isaías 28:7
Explicação: Entre outros pecados apontados por Deus, o povo
de Judá consumia bebida alcoólica. Os que faziam isto julgavam-se
fortes o suficiente para não se embriagarem. Mas eram atingidos por
seus efeitos, perdiam seus freios, e deixavam-se corromper, inclusive
sacerdotes e profetas.
Explicação:
João Batista, como homem cheio do Espírito Santo e completamente
consagrado aos propósitos de Deus, não deveria consumir bebida
forte.
Explicação:
O servo de Cristo deve renunciar a qualquer coisa que possa fazer seu
irmão tropeçar na fé, seja a carne sacrificada aos ídolos ou o
consumo de bebida alcoólica.
Explicação:
O Novo Testamento ensina, com muita clareza, o que já é ensinado no
Velho Testamento: O uso da bebida alcoólica é empecilho a sermos
controlados e usados pelo Espírito Santo. Ao invés de deixar-nos
levar por nossos desejos carnais, devemos ser completamente submissos
ao Espírito Santo de Deus. Alguns crentes creem que a ênfase está
em não embriagar-se, mas a realidade é que o consumo de bebida
alcoólica é resultado de concupiscência, e sempre traz o risco
potencial da embriaguez. Quem dá prioridade a ser controlado pelo
Espírito Santo renuncia aos desejos carnais, inclusive o consumo da
bebida alcoólica.
não dado ao vinho, não espancador, mas
moderado, inimigo de contendas, não ganancioso;
1 Timóteo 3:3
• Pois é necessário que o bispo seja
irrepreensível, como despenseiro de Deus, não soberbo, nem
irascível, nem dado ao vinho, nem espancador, nem cobiçoso de torpe
ganância; Tito
1:7
Explicação:
O pastor não deve ser um apreciador de bebida alcoólica, pois ele
deve apresentar em sua conduta o padrão de vida para todos os
crentes, servindo de exemplo aos irmãos. Portanto, abster-se da
bebida alcoólica é propósito para todos os crentes em Cristo.
2. TEXTOS APARENTEMENTE FAVORÁVEIS
Explicação:
A ênfase considerando os demais versículos deste texto, é que o
rei não deve consumir bebida alcoólica. Este versículo não
invalida o texto, mas apresenta uma exceção para o seu consumo como
lenitivo para os moribundos que sofrem dores e estão amargurados.
Trata-se de exceção, e não de uma regra geral.
E aquele dinheiro darás por tudo o que
desejares, por bois, por ovelhas, por vinho, por bebida forte, e por
tudo o que te pedir a tua alma; comerás ali perante o Senhor teu
Deus, e te regozijarás, tu e a tua casa.
Deuteronômio 14:26
Explicação: A alegria não vem do uso da bebida, mas de
cumprir uma ordem de Deus quanto ao dízimo. O texto não está
recomendando o uso da bebida, mas mencionando uma situação. O
ensino central do texto é sobre o dízimo. Somente retrata a
realidade que, em seus primórdios, o povo de Israel fazia uso da
bebida, embora não fosse dos propósitos de Deus. A poligamia também
não era plano de Deus, mas era praticada em Israel, e havia até
preceitos na lei de Israel a respeito dela (Deuteronômio 21:15). A
revelação progressiva de Deus foi trazendo luz sobre sua vontade
para nós.
Explicação:
O ato de derramar bebida alcoólica perante Deus como oferta não
pode ser interpretada como uma aprovação de Deus para o seu
consumo, pois ele o condena. Os sacerdotes eram proibidos de fazerem
uso de bebida forte quando estavam servindo a Deus no templo, e a
justificativa para isto é que tal abstinência servia para ensinar a
diferença entre o santo e o profano, entre o imundo e o limpo.
(Levítico 10:8-11). Ou seja, o sacerdote colocava diante de Deus
algo que era impuro e profano, mas a que tinha renunciado para servir
a Deus em santidade e consagração. Esta atitude representava “aroma
agradável ao Senhor” tanto quanto o holocausto oferecido a Deus.
No Novo Testamento há a ordem de apresentarmos nossos corpos em
sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o nosso culto
racional (Romanos 12:1).
e foi também convidado Jesus com seus
discípulos para o casamento.
E, tendo acabado o vinho, a mãe de Jesus
lhe disse: Eles não têm vinho.
Respondeu-lhes Jesus: Mulher, que tenho eu
contigo? Ainda não é chegada a minha hora.
Disse então sua mãe aos serventes: Fazei
tudo quanto ele vos disser.
Ora, estavam ali postas seis talhas de
pedra, para as purificações dos judeus, e em cada uma cabiam duas
ou três metretas.
Ordenou-lhe Jesus: Enchei de água essas
talhas. E encheram-nas até em cima.
Então lhes disse: Tirai agora, e levai ao
mestre-sala. E eles o fizeram.
Quando o mestre-sala provou a água tornada
em vinho, não sabendo donde era, se bem que o sabiam os serventes
que tinham tirado a água, chamou o mestre-sala ao noivo
e lhe disse: Todo homem põe primeiro o
vinho bom e, quando já têm bebido bem, então o inferior; mas tu
guardaste até agora o bom vinho.
João 2:1-10
Explicação:
Certamente Jesus transformou a água em vinho novo, pois, judeus por
esta época evitavam uso de bebida forte devido às instruções da
Palavra de Deus (veja textos anteriores).
veio o Filho do homem, comendo e bebendo, e
dizeis: Eis aí um comilão e bebedor de vinho, amigo de publicanos
e pecadores. Lucas
7:34
Explicação:
Jesus está repetindo o que diziam a respeito dele para denegri-lo.
Por sua participação nos banquetes que lhe eram oferecidos, Jesus
está sendo acusado de glutão e beberrão por seus adversários.
Isto demonstra como o uso da bebida alcoólica era mal visto pelos
judeus na época de Jesus (veja Provérbios 23:20). O vinho novo
(suco de uva) é que era usualmente consumido às refeições.
Explicação:
Paulo está recomendando o uso do vinho misturado com água como
medicação para as enfermidades de Timóteo. Na época havia pouco
conhecimento de medicina e farmácia, e poucos produtos estavam
disponíveis como remédios. Portanto, trata-se de uma exceção para
aquela época, e não um ensino geral.
Conclusão:
Embora israelitas fizessem uso da bebida
alcoólica, fica claro examinando os textos bíblicos que o
propósito de Deus não é este.
Sacerdotes, profetas, e homens consagrados a
Deus, deveriam abster-se do álcool. Quem quer servir a Deus deve
fazer assim.
Nos exemplos de Sansão e João Batista, vemos
que o uso do álcool não é compatível com a atuação do Espírito
Santo, verdade que é ratificada claramente no Novo Testamento
(Efésios 5:19).
A bebida alcoólica é traiçoeira e mortal
como animais venenosos escondidos. Tal qual a vítima que corre
perigo sem saber, aquele que tenta beber moderadamente corre o risco
de entregar-se totalmente ao álcool. Muitas pessoas que iniciam
bebendo moderadamente tornam-se vítimas do alcoolismo (Provérbios
23:32)
Se há o risco de escandalizar um irmão
devido ao uso da bebida alcoólica, melhor não beber.
O Novo Testamento deixa claro que não devemos
ser apreciadores de bebida alcoólica.
A Bíblia ensina que somos massa nova sem
fermento velho, tal qual a páscoa. Devemos renunciar a qualquer
coisa que nos atrapalhe de buscar a Deus e servi-lo. Se colocarmos
nossos desejos, apetites e paixões carnais acima da Palavra de Deus,
certamente isto não será possível. Se estivermos atentos e
submissos à Palavra de Deus, poderemos celebrar a festa da nossa
libertação em Cristo em sinceridade e verdade (I Coríntios 5:7-8).
Pr. Dalton S. Lima